Publicado em 1572, o livro Os Lusíadas, de Camões, é um clássico da literatura portuguesa. Divido em dez cantos, o longo poema épico é um grande elogio ao povo português.
Resumo
Na epopeia de Camões o objetivo é cantar a pátria, a história de Portugal. Os versos camonianos celebram os “feitos da famosa gente” portuguesa (canto I), enaltecem “o peito ilustre lusitano” (canto I). A viagem de expansão marítima se torna pretexto para que toda a história passada de Portugal seja cantada.
“Há um propósito de imortalização coletiva n’Os Lusíadas”. Helder Macedo
Os Lusíadas também ilustram uma época e demonstram a incapacidade do europeu, mais especificamente do português, de sair de si para identificar-se com o Outro. No poema se observa um europeu impermeável a cultura do Oriente, incapaz de compreendê-la. Camões evidencia a todo o momento uma preocupação em dizer a verdade no seu poema épico, ele frisa em diversas passagens o desejo de cantar os acontecimentos que julga verdadeiros com total transparência: “A verdade que eu conto, nua e crua,/ Vence toda a grandíloca escritura” (Canto V) Conheça os primeiros versos do poema, retirados do canto I:
As armas e os Barões assinalados Que da Ocidental praia Lusitana Por mares nunca de antes navegados Passaram ainda além da Taprobana, Em perigos e guerras esforçados Mais do que prometia a força humana, E entre gente remota edificaram Novo Reino, que tanto sublimaram; E também as memórias gloriosas Daqueles Reis que foram dilatando A Fé, o Império, e as terras viciosas De África e de Ásia andaram devastando, E aqueles que por obras valerosas Se vão da lei da Morte libertando, Cantando espalharei por toda parte, Se a tanto me ajudar o engenho e arte.
As primeiras linhas do poema épico anunciam o percurso das grandes navegações e o rumo que o poema épico irá tomar. Os versos dedicam-se a homenagear o povo português, aqueles que superaram perigos e guerras para fazer avançar o Império e a Fé. Além de narrar a conquista do novo reino, Camões já nas primeiras linhas se compromete a contar a história, se for capaz de tamanho “engenho e arte”. Além de narrar a genealogia de Portugal, das conquistas ultramarinas, o poema exalta, sobretudo, o povo português.
Capa da primeira edição de Os Lusíadas.
Estrutura
O poema épica é dividido em dez cantos. No total são 1.102 estrofes, cada uma com oito versos, todos decassílabos heroicos.
Estilo da narração
A narrativa começa in medias res (ou seja parte do meio da ação para então voltar a narrar para trás), no meio da viagem de Vasco da Gama. A história de Portugal é contada cronologicamente por Vasco da Gama ao rei de Melinde. A viagem à Índia é metonímia de todas as navegações portuguesas. A construção do poema em si é extremamente bem delineada e repetitiva. O herói guerreiro é protegido por determinados deuses e perseguido por outros até que, graças a sua valentia, coragem e persistência, supera as armadilhas e consegue chegar a terra distante, onde funda novo reino. O principal inimigo dos portugueses é Baco, que sente ciúme e inveja, e é responsável, direta ou indiretamente, por todas as ciladas.
O episódio do velho do Restelo
Embora Os Lusíadas seja um elogio as grandes navegações, há um episódio, no canto IV, que se apresenta como a contra voz dentro do poema. O velho do Restelo é aquele que questiona e em última instância discorda da partida das naus, representando aqueles que ficam para trás após a partida dos homens para a grande empreitada.
A voz pesada um pouco alevantando, Que nós no mar ouvimos claramente, Cum saber só d'experiências feito, Tais palavras tirou do experto peito: - «Ó glória de mandar, ó vã cobiça Desta vaidade a quem chamamos Fama! Ó fraudulento gosto, que se atiça Cüa aura popular, que honra se chama! Que castigo tamanho e que justiça Fazes no peito vão que muito te ama! Que mortes, que perigos, que tormentas, Que crueldades neles experimentas!
O episódio da Ilha dos Amores
Outra contradição dentro do poema é a presença da Ilha dos Amores. No canto IX, um lugar místico surge em meio a rota onde os guerreiros vão repousar, rodeados de amantes. Em um poema que louva o império da Fé é de se surpreender a presença de um trecho como este:
Oh, que famintos beijos na floresta, E que mimoso choro que soava! Que afagos tão suaves! Que ira honesta, Que em risinhos alegres se tornava! O que mais passam na manhã e na sesta, Que Vénus com prazeres inflamava, Milhor é exprimentá-lo que julgá-lo; Mas julgue-o quem não pode exprimentá-lo.
Sobre a censura
Os versos de Os Lusíadas foram pouquíssimo censurados. Embora fizessem alusão ao amor carnal e ao culto pagão em uma época em que os Jesuítas governavam, a obra caiu na mão de um censor dominicano. Frei Bartolomeu Ferreira não só não solicitou grandes cortes e alterações como elogiou o Autor e o premiou. Camões passou a receber tença anual de quinze mil réis graças ao elogio do seu censor. A 2ª edição foi publicada em 1584, já com alguma censura. No entanto, em 1840, na Espanha, já havia duas traduções fiéis ao texto na íntegra.
Curiosidade sobre a composição da obra
Você sabia que a redação de Os Lusíadas durou mais de uma dúzia de anos? Fica claro durante a leitura do poema de Camões como o autor recebeu profunda influência do gênero épico, especialmente de Ilíada e Odisseia. As epopeias ocidentais cantam originalmente os grandes feitos, as vitórias de um povo conquistador, as peripécias da guerra, os grandes heróis em um espaço territorial ainda não organizado sob a forma de civilização urbana.
Leia Os Lusíadas na íntegra
O clássico Os Lusíadas encontra-se disponível para download gratuito em formato pdf.
Os Lusíadas em audiolivro
Uma outra maneira de conhecer o clássico camoniano é ouvindo os seus versos, o poema épico está disponível na íntegra:
https://youtu.be/OtU0jqEnLt
Que tal conhecer um pouco melhor o poeta Luís de Camões? Nascido em 1524 ou 1525, provavelmente originário de uma família da Galiza, suspeita-se que tenha frequentado ao mesmo tempo centros aristocráticos e o circuito boêmio de Lisboa. De toda forma esteve de fora do círculo dos letrados, se envolveu em confusões, foi preso, degredado. Segundo Manuel Severim de Faria, primeiro biógrafo de Camões, o poeta foi preso em Goa, em 1556, por um governador da Índia. Logo em seguida foi exilado para a China. No canto X de Os Lusíadas há uma referência ao “injusto mando”. Nessa ocasião houve um naufrágio no navio onde Camões estava, reza a lenda que o escritor salvou o seu manuscrito a nado. Camões regressa a Portugal em 1569.
Retrato de Camões.
Em 1571, finaliza Os Lusíadas e o oferece a D.Sebastião, obtendo o alvará que permite a impressão (desde que condicionada a uma licença especial, que a obra passe pela avaliação da inquisição). Em 1572, Os Lusíadas é impresso. Além de ter escrito o maior poema épico em língua portuguesa, Camões também criou célebres versos de amor. É de sua autoria, por exemplo, o poema Amor é fogo que arde sem se ver.
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