in: https://www.publico.pt/tecnologia/noticia/recurso-a-tecnologia-nas-salas-de-aula-prejudica-resultados-academicos-1732195
Recurso à tecnologia nas salas de aula prejudica resultados académicos
PÚBLICO
16/05/2016 - 23:14
Estudos recentes concluem que as turmas que não usam tecnologia nas salas de aula conquistam melhores resultados académicos e conseguem responder a raciocínios mais complexos.
Estudos anteriores concluem que o uso de computadores diminui a capacidade de responder a raciocínios complexos JOSÉ CARLOS COELHO
Um estudo publicado pelo departamento de Economia do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT) conclui que as turmas sem computadores nas salas de aula obtêm melhores resultados do que turmas que podem recorrer parcial ou totalmente a tecnologia. O estudo é destacado peloWashington Post e relança a discussão dos últimos anos sobre as consequências do uso de computadores nas salas de aula. O jornal norte-americano escreve que este estudo ganha relevância pelo número de alunos analisado, comparativamente com os estudos anteriores.
O tema tem dividido professores e educadores e multiplicado as teorias e opiniões entre os especialistas na área da Educação. Se, por um lado, há quem considere que os computadores na sala de aula são uma distracção, por outro o molde “aborrecido e tradicional” das aulas é apontado como o principal culpado da desatenção dos alunos. Em 2003, por exemplo, um estudo da Universidade de Princeton e da Universidade de Califórnia, alertava que tirar apontamentos no computador dificultava a aprendizagem. Ao escrever em computadores, os alunos tinham mais dificuldade em recordar-se do que tinham escrito comparativamente com alunos que faziam as suas anotações num caderno. Já em 2014, um outro estudo acrescentava que os alunos tinham mais dificuldade em compreender os raciocínios mais complexos quando tiravam notas através de um computador. À data, os investigadores explicavam que os alunos que usam os computadores tendem a transcrever as aulas e não processam a informação, o que prejudica o desenvolvimento do seu raciocínio e e da sua aprendizagem, diminuindo a capacidade de resposta e os resultados académicos.
No estudo desenvolvido pelo MIT, os investigadores dividiram um conjunto de alunos da Academia Militar dos EUA em três grupos diferentes de forma a comparar os resultados obtidos na mesma instutuição, com os mesmos métodos de ensino e com as mesmas matérias de estudo. O primeiro grupo usou computadores ou tablets para tirar apontamentos durante as aulas. O segundo usou tablets, mas apenas para recorrer a materiais ligados às aulas. Já o terceiro grupo não tinha permissão para usar qualquer tipo de instrumento tecnológico.
Os alunos que tinham autorização para usar os computadores foram os que obtiveram os piores resultados. Além disso, o estudo mostra ainda que os melhores alunos foram os mais prejudicados pelo recurso ao apoio tecnológico.
No estudo, os investigadores confessam ter ficado surpreendidos com a prestação dos melhores alunos, pois esperam que estes usassem a tecnologia de uma forma "prudente". Daqui podem tirar-se duas conclusões possíveis: ou os alunos sobrestimaram a sua capacidade de multitasking ou os que não usaram tecnologia conseguiram maximizar o seu nível de atenção. Seja qual for a justificação, o estudo conclui que o uso de tecnologia durante as aulas, mesmo servindo meramente de apoio, prejudica os resultados académicos.
“Num ambiente com menos incentivos para a obtenção de bons resultados, menos restrições disciplinares a comportamentos distractivos e turmas maiores, os efeitos do uso da tecnologia podem ser ainda maiores”, sublinha o estudo. Além disso, os investigadores acreditam que “retirar os computadores das salas de aula seria mais eficiente para a prestação académica de um aluno do que uma bolsa de mérito”.
in: https://www.publico.pt/sociedade/noticia/o-lugar-do-telemovel-na-sala-de-aula-e-em-cima-da-mesa-dos-alunos-1722843
REPORTAGEM
O lugar do telemóvel na sala de aula é em cima da mesa dos alunos
10/02/2016 - 08:07
Agrupamento de escolas de Ponte de Lima é considerado exemplar pela Microsoft graças ao uso da tecnologia na aprendizagem. Nove dos professores destacados pela multinacional estão aqui.
Nos ecrãs tácteis, está aberta a ficha de trabalho que a professora preparou para esta manhã
ADRIANO MIRANDA
Os telemóveis nas mãos dos alunos do 6.ºA estão apontados às folhas que têm à sua frente. Olham para o ecrã, conferem a informação e regressam à ficha de trabalho a que estão a responder com o à-vontade de quem sabe que não está a fazer nada errado. A professora Maria João Passos segue-os atentamente e presta assistência quando a tecnologia não responde à velocidade desejada. Nas salas do agrupamento de escolas de Freixo, em Ponte de Lima, o lugar dos telefones e outros dispositivos móveis é em cima das mesas, resultado de um conjunto de projectos de integração das tecnologias na aprendizagem que a Microsoft considera exemplar, pelo quarto ano consecutivo.
Esta é a aula de Matemática. Os alunos estão dispostos em grupos de quatro, em mesas redondas, onde também há computadores portáteis. Nos ecrãs tácteis, está aberta a ficha de trabalho que a professora preparou para esta manhã. Os exercícios podem ser resolvidos directamente no computador, com o auxílio de uma caneta apropriada. É então que se percebe o motivo para os telemóveis estarem também por perto: a solução para a ficha está inscrita em códigos QR (uma espécie de código de barras). Os alunos têm de usar uma aplicação nos seus telefones para ler os códigos, fazendo corresponder cada um aos resultados a que chegaram.
“Normalmente os manuais têm a resolução no final e os alunos têm, muitas vezes, a tentação de ir procurá-las”, lembra Maria João Passos. Com este recurso, a chave também lá está, mas obriga a que o exercício seja realmente resolvido para que os estudantes consigam descobrir qual das respostas corresponde a cada um dos códigos. Por outro lado, habituam-se a utilizar a tecnologia em contexto de sala de aula.
Os códigos QR e as fichas de trabalho resolvidas em ecrãs tácteis não são os únicos recursos tecnológicos da professora de Matemática. A docente da escola de Freixo disponibiliza frequentemente tutoriais sobre os conteúdos das aulas na Internet. “Muitas vezes, os próprios pais também vêem os vídeos, para os poderem ajudar a tirar dúvidas”, conta. Além disso, criou um grupo na rede social Yammer com todos os alunos das suas três turmas do 6.º ano. Chama-lhe “sala de estudo virtual” e serve para os estudantes colocarem questões, comentarem a matéria e trabalharem os conteúdos disponibilizadosonline. A professora é “um último recurso”, já que a ideia é que os estudantes sejam capazes de tirar dúvidas uns aos outros, num trabalho colaborativo feito a partir de casa.
Por causa deste projecto usado para o ensino de Matemática, Maria João Passos foi considerada “especialista inovador em educação” pela Microsoft este ano. Na lista, há 3700 professores em todo o mundo, 57 dos quais são portugueses. Entre eles, há outros oito colegas no agrupamento de escolas de Freixo. O estabelecimento de ensino também está em destaque nas escolhas da multinacional de software, sendo considerada uma escola-modelo. É a quarta vez consecutiva que é distinguido. Este ano há outros seis representantes nacionais, dos quais apenas mais um pertence à rede pública, o agrupamento de escolas de Vila Nova de Cerveira.
A escolha da Microsoft é um reconhecimento da aposta que a escola tem feito no uso das tecnologias, valoriza o director do agrupamento, Luís Fernandes, que, desde o Verão passado, também passou a integrar o conselho consultivo da multinacional para o sector educativo. É uma das dez pessoas a quem a gigante norte-americana recorre para pedir opiniões sobre a área da educação. “Por que motivo uma empresa que pode contratar os consultores que quiser vem a Portugal convidar o director de uma escola pública?”, atira em jeito de pergunta retórica, para rapidamente dar a resposta: “Devemos ter feito alguma coisa bem.”
No agrupamento, os alunos do 3.º e 4.º anos têm, desde há dois anos, aulas de programação, onde aprendem linguagem como Scratch e Kodu. No 3.º ciclo podem também escolher uma disciplina de mecanismos e robótica, na qual trabalham com mecânica, electrónica e eletrotecnia. E depois há projectos específicos de cada professor, como o de Maria João Passos na Matemática do 6.º ano. Há muitos docentes que ainda seguem o método de ensino tradicional, até porque nesta escola “ninguém impõe nada a ninguém”, sublinha o director. Mas já há mais de uma dezena de professores a integrar as tecnologias nas suas aulas, num processo “crescente”.
Existe um efeito de contágio, aponta Luís Fernandes. Os docentes acabam por aderir ao uso de computadores ou dispositivos móveis à medida que vão conhecendo as boas experiências dos colegas e há também pressão dos alunos nesse sentido, à medida que vão sabendo o que se passa nas aulas das outras turmas. A escola também promove encontros, acções de formação e outras ferramentas de apoio para incentivar os docentes a usarem a tecnologia.
A velocidade da Internet fornecida pela rede de banda larga instalada pelo Ministério da Educação não tem rapidez suficiente. Foi preciso comprar um dispositivo de Internet móvel 4G que roda de sala em sala
A aproximação da escola de Freixo à tecnologia começou há oito anos, quando foram comprados dois kits para um clube de robótica. A reacção dos alunos foi “imediata e entusiástica”, lembra o director, ao ponto de aquele ter passado a ser o único clube escolar com lista de espera. Hoje, a robótica continua a ser uma das principais formas de contacto dos alunos com as inovações. Um antigo balneário, junto ao pavilhão desportivo, foi transformado num Fab Lab, um laboratório equipado com duas impressoras 3D, uma máquina de corte a laser e outros dispositivos para montagem de robôs como aquele que Luís Henrique, de 15 anos, apresenta: “É um robô de busca e salvamento. Nas provas, deve ir buscar a vítima (normalmente uma bola) e levá-la a um ponto determinado.”
Foi este aluno do 9.º ano quem projectou o dispositivo para levar às competições nacionais de robótica, onde outros estudantes da escola já ganharam o título de campeões nacionais em anos anteriores. Luís Henrique começou a frequentar o laboratório há dois anos. Um professor falou-lhe da possibilidade e decidiu experimentar durante um par de semanas. Gostou tanto que agora passa ali “muitos dos tempos livres”, conseguiu uma autorização para levar algum do material para trabalhar em casa e descobriu o que quer fazer no futuro: “Seguir Engenharia Electrotécnica.”
A aposta na tecnologia embate, porém, num problema também tecnológico. A velocidade da Internet fornecida pela rede de banda larga instalada pelo Ministério da Educação na escola não é suficientemente rápida para permitir um acesso eficaz aos conteúdos colocados na nuvem – ou seja, em servidores externos. Por isso, a escola de Freixo teve de comprar um dispositivo de Internet móvel 4G, que, quando é necessário, roda de sala em sala para resolver os problemas dos professores. “A velocidade que nos chega não nos permite fazer um trabalho do século XXI”, lamenta o director.
Além disso, não faltam os problemas “que as outras escolas têm”, aponta Luís Fernandes. Há infiltrações nas paredes e nos tectos, piso com sinais de desgaste e um pavilhão desportivo a precisar de reforma – além de um contexto sócio-económico considerado difícil.
O agrupamento tem 700 alunos, do pré-escolar ao 9.º ano, quando há cinco anos eram 1100 os estudantes inscritos. Esta redução não é apenas efeito da crise de natalidade que afecta quase todo o país, mas também dos problemas específicos desta população, particularmente afectada pela emigração. A escola situa-se numa zona rural, no sul do concelho de Ponte de Lima, praticamente à mesma distância da sede de concelho e de Braga – cerca de 15 quilómetros. Nas imediações não existem empresas capazes de criar postos de trabalho para muita gente, apenas indústrias de pequena dimensão e alguma agricultura, produção de vinho e pecuária. A escola é mesmo o maior empregador das freguesias que abarca.
Isto coloca outros problemas: 70% dos alunos recebem apoios sociais e tornou-se necessário entregar um suplemento alimentar ao longo do dia a “boa parte” deles. Ainda assim, a “esmagadora maioria” tem acesso à Internet fora da escola. Quase todos têm pelo menos um computador, tablet ou telemóvel com acesso à rede, o que permite acederem aos conteúdos disponibilizados pelos professores a partir de casa.
Tudo isto se conjuga nos resultados da escola nos exames do 9.º ano. Noranking de 2015, a escola estava em 265.º lugar, tendo subido 436 posições face ao ano anterior, mercê de uma média de 3,04 valores. O director tem consciência de que os resultados são “medianos” e é preciso “trabalhar mais” para os exames do fim de ciclo, mas sublinha o “longo caminho” percorrido: “No primeiro ano em que houve exames no 9.º ano, tivemos apenas 17% de positivas.”
Existem ainda outros obstáculos. As escolas secundárias ou profissionais mais próximas estão a 15 e 20 quilómetros de distância (em Ponte de Lima ou Braga, mas também Barcelos ou Viana do Castelo em alguns casos). A maioria dos alunos segue para cursos profissionais e são ainda poucos os que chegam ao ensino superior. “É algo que demora tempo”, argumenta Luís Fernandes. “Uma certeza tenho: quando saem daqui, tiveram experiências que noutras situações não teriam e sabem que podem escolher.”
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